Confiram aqui o primeiro capítulo de "A probabilidade estatística do amor à primeira vista": http://bit.ly/ProbabilidadePrimeiroCap

Tanta coisa podia ter sido diferente.
Imagine se ela não tivesse esquecido o livro. Não teria
que voltar correndo para casa enquanto a mãe esperava no
carro, com o motor soltando fumaça no ar quente da tarde.
Ou mesmo antes: imagine se ela não tivesse experimentado
o vestido. Não teria percebido que as alças estavam muito
compridas, e sua mãe não precisaria pegar o antigo kit de
costura, nem transformar a mesa da cozinha numa mesa
cirúrgica para tentar salvar o pobre pedaço de seda lilás no
último minuto.
Ou mais tarde: se ela não tivesse cortado o dedo com o
papel na hora de imprimir a passagem, se não tivesse perdido
o carregador do celular, se não tivesse enfrentado o trânsito
até o aeroporto. Se não tivessem errado o caminho e se ela
não tivesse demorado a achar o dinheiro do pedágio — as
moedas caíram embaixo do assento e os passageiros nos
carros atrás delas buzinaram sem perdão.
Se a rodinha da mala não tivesse emperrado.
Se ela tivesse corrido mais rápido até o portão de embarque.
Talvez os atrasos no decorrer do dia sejam apenas detalhes, mas, se não fosse por eles,
teria sido por causa de alguma outra coisa: as condições do tempo no Atlântico,
a chuva em Londres, as nuvens pesadas que ficaram muito
tempo no ar, antes de se dissiparem. Hadley não acredita em
coisas como acaso ou destino, mas também jamais acreditou
na pontualidade das companhias aéreas.
Quando é que um avião consegue sair na hora?
Ela nunca havia perdido um voo na vida. Nem uma vez.
No entanto, quando chegou ao portão naquela noite,
encontrou os atendentes fechando a entrada e desligando os
computadores. O relógio marcava 18h48, e lá fora o avião
parecia uma fortaleza de metal. Ficou claro na expressão
dos funcionários que ninguém mais entraria naquela coisa.
Ela estava quatro minutos atrasada, o que não parece ser
muito. É o tempo de um comercial, de um intervalo entre
aulas, de descongelar um prato no micro-ondas. Quatro
minutos não é nada. Todo santo dia, em qualquer aeroporto,
há pessoas que estão atrasadas para o seu voo. Chegam respirando de forma ofegante e se jogam no assento, aliviadas por estarem ali.
Mas não Hadley Sullivan, que, de pé diante da janela,
deixa a mala cair no chão e observa o avião se distanciar
da rampa semelhante a um acordeão, com as asas girando
enquanto a parte da frente se direciona para a pista de decolagem sem ela.
No outro lado do oceano, seu pai brinda uma última vez,
e a equipe do hotel — todos de luvas brancas — cuida dos
talheres de prata para a cerimônia da noite seguinte. Atrás
dela, o garoto com a passagem para o assento 18C no voo
seguinte para Londres come rosquinha, sem notar os pedacinhos na camisa azul.
Hadley fecha os olhos só por um momento. Ao abri-los
novamente, o avião não está mais lá.
Quem diria que quatro minutos poderiam mudar tudo?
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